Nos últimos 40 anos, o Brasil perdeu 111,7 milhões de hectares de áreas naturais — uma área maior que a Bolívia. A Amazônia foi o bioma mais afetado: 52,1 milhões de hectares destruídos nesse período. Só no último ano, 4.495 km² foram desmatados na região, um aumento de 4% em relação ao período anterior. O combate a esse avanço exige mais que fiscalização: requer também inteligência, precisão e agilidade na tomada de decisões.
Com esse objetivo, pesquisadores do Departamento de Engenharia Elétrica da PUC-Rio desenvolveram um modelo de Inteligência Artificial (IA) capaz de prever, com até 15 dias de antecedência, as áreas da Amazônia Legal com maior risco de desmatamento. O projeto foi realizado em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
Batizada de Deforestation Prediction System, a nova ferramenta já está em operação na plataforma de dados geográficos TerraBrasilis, do INPE. Ela está disponível tanto para o Ibama quanto para prefeituras da região, com o intuito de apoiar decisões estratégicas de fiscalização e prevenção, aumentando a eficiência das ações e reduzindo desperdícios de recursos públicos.
Por que o Ibama precisa de um sistema mais moderno?
A criação do sistema responde a uma necessidade urgente: a atualização dos métodos usados para prever o desmatamento. Até então, o Ibama utilizava uma ferramenta baseada em uma metodologia de cerca de 20 anos atrás. Com o avanço das técnicas de IA e a crescente urgência ambiental, o Ministério do Meio Ambiente buscou soluções mais modernas e eficazes.
A equipe da PUC-Rio, com mais de duas décadas de experiência em análise de imagens e sensoriamento remoto, foi convidada a coordenar o desenvolvimento metodológico da nova ferramenta, por indicação do INPE. O projeto contou com investimento de R$ 2,5 milhões da Climate and Land Use Alliance (CLUA), uma coalizão internacional voltada à proteção de florestas tropicais.
Iniciado em janeiro de 2024, o trabalho foi recentemente concluído, com a fase de implementação em andamento. A colaboração entre academia, governo e organizações internacionais foi fundamental para transformar conhecimento científico em aplicação prática de alto impacto.
Como a IA prevê o desmatamento
O modelo desenvolvido pela PUC-Rio se baseia na identificação de fatores que costumam preceder o desmatamento. Utilizando os extensos bancos de dados do INPE, como os sistemas PRODES e DETER, a equipe selecionou variáveis espaciais e ambientais que ajudam a antecipar o risco.
Após testar quatro abordagens distintas de IA, os pesquisadores optaram pelo modelo que ofereceu melhor equilíbrio entre precisão e eficiência computacional. O resultado foi um sistema capaz de apontar, com alto grau de acerto, as áreas com maior probabilidade de desmatamento em um horizonte de 15 dias.
Aplicação prática já começou
O sistema já está operacional na plataforma TerraBrasilis, que serve como base para a Sala de Situação do INPE. O Ibama participou ativamente da implementação, garantindo que a ferramenta atendesse às necessidades práticas de fiscalização em campo. Prefeituras da região também receberam acesso à tecnologia.
Para facilitar o uso da nova ferramenta, a equipe da PUC-Rio promoveu dois workshops. O primeiro, em Brasília, no fim de junho de 2025, reuniu técnicos do Ibama. O segundo, realizado em Manaus no fim de julho, contou com representantes de 67 municípios da Amazônia Legal, em parceria com o programa União com Municípios pela Redução do Desmatamento e Incêndios Florestais (UcM).
A tecnologia também se integra ao metaprojeto Amazonizar, uma iniciativa da PUC-Rio que reúne pesquisas e soluções voltadas aos desafios climáticos e à sustentabilidade na Amazônia e outros biomas.
IA promete reduzir erros em até 80% e mira novos biomas
Embora ainda seja cedo para medir o impacto direto da nova ferramenta nos índices de desmatamento, os resultados preliminares são promissores. Os testes indicam uma redução de 75% a 80% nos erros de previsão em comparação ao modelo anterior.
Com apoio do Ministério do Meio Ambiente, a equipe da PUC-Rio está desenvolvendo propostas para estender o uso da IA à previsão de outros problemas ambientais, como incêndios florestais e degradação ambiental, e também para adaptar o modelo a outros biomas brasileiros, como o Cerrado.
A aposta é clara: a união entre ciência e política pública pode transformar a forma como o Brasil protege seus ecossistemas mais valiosos.
Fonte: Tempo.
Foto: Getty Images