Os garimpeiros do Rio Madeira, na Amazônia, que foram alvo de uma operação de forças federais na última semana estão ganhando apoio de parlamentares de diferentes vertentes numa ofensiva para legalizar a exploração do ouro em rios do Norte do país. Há representantes da bancada federal que chegam a estimular uma espécie de caça às bruxas após a Operação Uiara ter incendiado 131 embarcações garimpeiras na região central do Amazonas.
É o caso do senador Plínio Valério (PSDB-AM), que usou a tribuna do Senado para protestar contra a ação federal após se reunir na última quarta-feira (1º/12) com prefeitos amazonenses da região do garimpo fluvial. “Temos a missão de conversar com autoridades para saber de onde partiu a ordem para queimar as balsas, para atirar”, discursou ele.
“Há que se ter respeito de não extrapolar. Porque todos foram tratados como marginais, e nem todos são marginais. A verdade é que hoje, nesses municípios, surgiu um exército de pobres perambulando pelas ruas. Não queremos estimular ilegalidade, mas procurar um equilíbrio”, completou.
A Operação Uiara foi comandada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e seu resultado foi comemorado até pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e pelo vice, Hamilton Mourão (PRTB), que defendeu no último dia 29 a queima de balsas flagradas fazendo o garimpo ilegal.
A ação federal foi motivada pelo impacto causado pelas imagens de um grande garimpo flutuante que se formou nas últimas semanas na região de Autazes, a 113 km de Manaus, reunindo cerca de 600 balsas. O garimpo fluvial no Madeira e em outros rios amazônicos, porém, não é nenhuma novidade – argumento usado pelos parlamentares para defender um entendimento que considere a possibilidade de regularização e não apenas o combate com forças de segurança, como a Polícia Federal.
Essa pauta une políticos como o deputado federal Delegado Pablo (PSL-AM), que é bolsonarista, e o senador Omar Aziz (PSD-AM), que se tornou um dos grandes adversários políticos de Bolsonaro ao presidir a CPI da Covid-19. Aziz esteve entre os senadores amazonenses que se reuniram com a comitiva de prefeitos e representantes dos garimpeiros em Brasília.
Após a reunião, Aziz, que já governou o Amazonas, disse a jornalistas que não se pode permitir o “prejuízo ambiental”, mas que os parlamentares da região Norte costumam receber pedidos de prefeitos e lideranças políticas da região para uma solução que regularize o garimpo em pequena escala. Já Pablo usou suas redes sociais na quinta (2/12) para dizer que é preciso “separar o joio do trigo” e disse que os mineradores podem contar com ele. Veja:
Outro opositor de Bolsonaro, apesar de estar no mesmo partido do presidente, o PL, o deputado estadual pelo Amazonas Marcelo Ramos disse ao jornal A Crítica que a mineração na Amazônia é um fato consumado e que “uma boa regulação pode ser um caminho para uma atividade sustentável” e que prefere não se “enganar fingindo que [o garimpo] não existe ou que o Estado dará conta de reprimir toda atividade ilegal”.
A comitiva de prefeitos amazônicos também foi recebida em uma reunião com o ministro da Defesa, Walter Braga Neto, na quarta-feira. Os prefeitos da região do Madeira que convive há décadas com o garimpo fluvial, se opuseram ao que consideraram exagero na operação federal e estiveram em Brasília para pedir que a Polícia Federal, o Ibama e as Forças Armadas deixem de queimar as balsas dos garimpeiros.
A reportagem do Metrópoles esteve no Rio Madeira durante o desenrolar da operação e mostrou que a queima das balsas deixou muitas famílias de garimpeiros às margens do curso d’água apenas com a roupa do corpo e dependendo da ajuda da população ribeirinha – que tem opiniões divididas sobre o garimpo, já que a presença das balsas em alguma cidade costuma ter alto impacto positivo na economia local, mas impacto destruidor na natureza. A atividade extrativista utiliza mercúrio, um metal neurotóxico, no processo de separação do metal precioso.
O garimpo no Madeira chegou a ser regulamentado pelo governo estadual em 2017, na gestão do então governador Amazonino Mendes (Podemos-AM). A ação política veio após graves conflitos em Humaitá, no sul do Amazonas, onde garimpeiros indignados com ações de fiscalização incendiaram as sedes do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Biodiverdidade (ICMBio). Meses depois, porém, a Justiça Federal cancelou as licenças concedidas pelo governo amazonense alegando que a legalização ignorou os impactos ambientais.
Agora, membros da bancada federal articulam uma legalização vinda de Brasília, que desse mais segurança aos garimpeiros fluviais e garantisse uma fiscalização ambiental que obrigasse a atividade a se profissionalizar e a pagar impostos.
A tendência no Congresso Federal, porém, é de resistência a iniciativas que busquem afrouxar a repressão ao garimpo, mas ao menos um resultado prático a pressão política deve colher: o enfraquecimento do ímpeto de autoridades federais no esforço de combate a essa atividade. Desde que as articulações políticas se intensificaram, a PF não queimou mais nenhuma balsa no Madeira, apesar de o governo não ter decretado ainda o encerramento da operação.
Fonte: Metropoles